Telemarketing poderia perfeitamente ser uma das dez pragas do Egito, se Graham Bell tivesse nascido séculos antes.
Depois de os rios virarem sangue, das nuvens de gafanhotos e da morte dos primogênitos, tocaria o telefone.
-Bom dia! Eu vou estar fazendo uma oferta especial para o senhor.
O "bom dia" vem sempre num entusiasmo inversamente proporcional ao seu interesse pelo produto oferecido. Oferecido, aliás, sem que ninguém tivesse pedido nada. Ainda mais aquela hora da manhã.
Onde foi parar a regra civilizatória que impedia as pessoas de telefonar umas para as outras antes das dez horas da manhã? Ou, simplesmente, que as impedia de ligar aleatóriamente para desconhecidos?
E tem coisa mais irritante que gerúndio de telemarketing? Tem. É saber que, na hora em que você realmente precisa falar com o serviço de atendimento ao cliente de uma empresa, passa horas ouvindo musiquinhas monofônicas e sendo jogado de ramal em ramal. Haja SAC. Cadê os telefonistas quando se precisa deles?
Bem, devem estar preoculpados com os projetos de lei que estão por aí. Correm pelas Assembléias Legislativas de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia propostas semelhantes à já aprovada no Distrito Federal.
Em Brasília, deve entrar em vigor nas próximas semanas o "não pertube". É simples. Se o cidadão não deseja ser pertubado pelo telemarketing, basta cadastrar seu número de telefone. A empresa que insistir em ligar paga multa de 10 mil reais por chamada.
Finalmente. Numa de suas muitas crônicas antológicas, "Chatear e Encher", Paulo Mendes Campos já mostrava como um prosaico telefone pode ser um instrumento a serviço do mal. A história é premonitória.
Um fulano liga várias vezes seguidas para um escritório, e sempre pergunta por um tal de Valdemar - que, ele sabe muito bem, não trabalha lá. No quarto telefonema, o infeliz do outro lado da linha perde a paciência e responde kcoisas impublicáveis. Até aqui, explica o cronista, é chatear. Encher é voltar a ligar dali a dez minutos, dizendo: "Quem fala aqui é o Valdemar. Alguém ligou para mim?".
Hoje, "Chatear e Encher" é pouco. Em tempos de telemarketing, "irritar e enfurecer" dá mais conta do que acontece quando toca o telefone.
Na coluna Meu destak do jornal homônimo nº 500 Ano 03
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